AMIG afirma que o Brasil relegou a atividade de mineração a segundo plano, nas últimas décadas

Associação, que acaba de completar 35 anos de fundação, afirma que o protagonismo dos municípios mineradores é essencial para combater a sonegação, a falta de fiscalização e desoneração fiscal do setor


Muito se foi conquistado para garantir a perpetuação da atividade minerária no Brasil, desde seu início na época do Brasil Colônia, no século XVIII. Porém, ainda são inúmeros os desafios referentes à legislação e a fiscalização que regem o setor mineral. Para o presidente da Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (AMIG), José Fernando Aparecido de Oliveira, a falta de comprometimento do Governo Federal com a atividade de mineração tem trazido impactos significativos aos municípios mineradores, aos afetados e, consequentemente, à sociedade.

“O segmento minerário representa, aproximadamente, 10% do PIB nacional e gerou, em 2023, um faturamento de R$ 248,2 bilhões. A AMIG completou no último dia 20 de abril, 35 anos de fundação e o que temos visto é que, mesmo diante da relevância dos números e da representatividade do setor, o Brasil, nas últimas décadas, relegou a atividade de mineração a segundo plano e, por isso, deixou de extrair os melhores resultados possíveis”, alerta.

Ele pontua que essa situação acabou por potencializar os riscos da atividade, gerando tragédias antes impensáveis, como os rompimentos das barragens em Mariana e Brumadinho. “Entendemos que é urgente e necessário inaugurar, de forma responsável, um novo modelo de mineração brasileira.  A Agência Nacional de Mineração (ANM) vive um estado de penúria e sucateamento, que torna impossível a fiscalização efetiva dos recursos que deveriam ser arrecadados, a garantia da segurança de barragens e a devida regulação das mineradoras”, ressalta José Fernando.

Há falta de profissionais para fazer a fiscalização das áreas de mineração e garimpo. A arrecadação da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), por exemplo, é autodeclaratória. “A mineradora apura o valor relativo à extração mineral, entra no site da ANM e declara. De acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), de cada R$ 1 arrecadado pela ANM, outro R$ 1 é sonegado”, salienta.

Além disso, o Brasil possui 34 mil processos minerários ativos, sendo que destes, 13 mil se recolhem a CFEM. “A agência nos contou que possui apenas cinco fiscais para fiscalizar todos esses processos ativos.  É de uma estupidez e de um absurdo imensurável. Um deboche com os municípios e a sociedade”, enfatiza José Fernando.

O consultor de Relações Institucionais e Econômicas da entidade, Waldir Salvador, ressalta que está na hora de substituir o que não deu certo ao longo desses anos por uma prática mais decente, em favor das regiões mineradoras que alimentam boa parte da economia dos estados brasileiros. “É preciso criar nestas cidades a cultura de pertencimento e o entendimento de que elas podem e devem atuar de forma a garantir que os benefícios sejam cada vez mais tangíveis e os impactos suavizados. A AMIG soma mais três décadas de resistência e é por meio do empoderamento do poder público municipal que vamos mudar este cenário caótico”, destaca.

35 anos de resistência - Ao longo dos últimos anos, a AMIG tem travado muitas batalhas em prol das cidades mineradoras e afetadas pela atividade mineral. “Somos nós que temos qualificado as prefeituras para não aceitarem as imposições por parte das empresas mineradoras, que se autorregulam e autofiscalizam. Nós não precisamos e não queremos uma mineração a qualquer custo”, ressalta Waldir Salvador. 

Um dos grandes marcos conquistados pela associação ocorreu meses depois de sua criação, em 1989, quando foi instituída a CFEM, em substituição ao Imposto Único Mineral - IUM, após muitas cobranças e negociações da entidade com os Poderes Público e Legislativo. Em 2003, a AMIG conquistou uma cadeira no Conselho Estadual de Geologia e Mineração. O Decreto n° 43.689/2003, tinha como objetivo a formação e implantação da política estadual de desenvolvimento para os setores de geologia, mineração e do complexo da indústria de transformação mineral.

Em 2005, após estudo realizado pela AMIG, constatou-se que o Brasil tem os menores royalties minerais do mundo. A partir daí, iniciou-se a luta pelo aumento da alíquota do minério de ferro de 2% para 4% do faturamento bruto da CFEM. Em busca de melhoria na estrutura de fiscalização do antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), a AMIG trabalhou para que houvesse um aumento significativo no número de profissionais atuando em Minas Gerais. Naquela época, o DNPM já demonstrava sua estrutura sucateada, situação herdada pela ANM, e a AMIG já manifestava e alertava para as consequências desta deficiência.

Em novembro (2005), ocorreu a primeira grande fiscalização conjunta no Brasil por parte do  DNPM e a AMIG, que apontou um passivo de mais de R$22 bilhões aos municípios mineradores de Minas e Pará. Desse montante, os municípios e os estados receberam, em 2008, 2013 e 2016, cerca de R$ 840 milhões.

No ano de 2014, a AMIG iniciou os debates no Brasil sobre a importância da distribuição da CFEM para os municípios impactados pela atividade de mineração. A campanha “!Minério Juntos Nosso Marco”  teve como objetivo a luta pelo aumento da alíquota da CFEM e aprovação do Marco Regulatório da Mineração.

Em 2017, a associação articulou com o Ministério de Minas e Energia a criação de medida provisória para aumento da alíquota e iniciou a campanha "Alíquota Bruta, CFEM Justa", com reivindicações e propostas de alterações na MP 789/17.  A conquista veio com a aprovação na Câmara dos Deputados do texto base da MP 789/17, que alterou as alíquotas da mineração

No ano de 2018, foi publicado o Decreto 9.407/2018, solicitado pela AMIG, que regulamenta o critério de repasses da CFEM às cidades que são impactadas pela atividade de mineração. Em 2019  houve o primeiro repasse a estas cidades, que totalizou R$ 340 milhões.

No mesmo ano, um Grupo de Trabalho criado para revisão dos processos de fiscalização do grupo Vale S.A. apurou valores de, aproximadamente, R$ 1,9 bilhões em dívidas de pagamentos relacionados à CFEM, por parte da mineradora, com  28 municípios de 6 estados brasileiros. Também foi lançada uma campanha nacional de cobrança desse montante, que já ultrapassa os R$ 2,2 bi. A iniciativa foi destaque na imprensa de todo o Brasil.

2022 foi um ano de conquistas.  Uma delas foi a mudança da visão do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) sobre a legalidade na aplicação da CFEM, a partir do Incidente de Uniformização de jurisprudência provocado pela AMIG. No mesmo ano, houve a mudança na Lei 13.40 de 2017 e criação da Lei 14.514 de 2022, que altera as condições de distribuição da CFEM aos municípios mineradores e impactados pela atividade e cria o critério de município limítrofe.

Novas batalhas - A luta da AMIG não para. Atualmente, uma das batalhas travadas pela associação é por melhorias para garantir mais segurança e reduzir o número de acidentes e mortes nas BRs 040 e 356, que ligam Minas Gerais ao Rio de Janeiro. “Conseguimos um diálogo com o Ministério Público e o Centro Estadual de Autocomposição de Conflitos e Segurança Jurídica (Compor). Dispomos o que realmente precisamos fazer para retirar o fluxo de carretas das BRs 0 40 e 356. São, em média 156 mortes por ano nos trechos, além dos danos diários com congestionamento”, pontua Waldir Salvador. A proposta apresentada pela AMIG sugere transferir o fluxo de carretas de minério das duas BRs para estradas alternativas, que já existem, mas não são asfaltadas, em trechos que ligam a MG-030 e a ITA-330, que passam pelo município de Itabirito, na região Central.

O projeto irá reduzir a circulação de até 1500 carretas de minério das vias. Neste mês de abril, a AMIG realizou uma reunião com a Polícia Rodoviária Federal, que se comprometeu a elaborar um Termo de Cooperação com ações de curto prazo para atuar em conjunto com as prefeituras e aumentar a fiscalização nas BRs 040 e 356.

A Reforma Tributária também está em pauta na associação. A AMIG entende que o texto proposto tem sido uma incógnita para todos os segmentos da economia. Para o presidente da associação, a Reforma se deu sem uma discussão aprofundada com os setores produtivos e não se apresenta como uma solução para agregar valor ao desenvolvimento industrial, sustentável, capaz de impulsionar o crescimento do país.

“É preciso dar continuidade às reflexões e debates para que essa Reforma passe por ajustes e revisões tornando-se mais coerente e positiva para o Brasil. No que tange à mineração, a AMIG, contratou a Universidade Federal de Minas Gerais, por meio do Ipead (Instituto de Pesquisas Econômicas e Administrativas), do Cedeplar (Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas) e também da Faculdade de Direito, para realizar estudos sob os aspectos tributário, econômico e jurídico e retratar as perdas que os municípios mineradores sofrerão a partir da reforma”, explica José Fernando. Ele ressalta que, a partir de dados concretos, “será possível qualificar o debate e interferir nesse cenário extremamente negativo para as cidades mineradoras e para o desenvolvimento da mineração no Brasil.”