Prefeitos e gestores de municípios mineradores e afetados pela atividade mineral de todo o Brasil vão se reunir em Brasília para debater a realidade catastrófica que a reforma tributária (EC 132) trará em suas finanças, caso seja levada adiante da maneira que está. O evento, que contará com a presença de parlamentares, será promovido pela Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (AMIG) no dia 26 de junho, de 9h às 13h, no Centro de Convenções Brasil 21, sala Vera Cruz 2, no Setor Hoteleiro Sul, quadra 6, na Asa Sul.
José Fernando Aparecido de Oliveira, presidente da AMIG, explica que o texto proposto tira dos municípios mineradores duas das suas principais receitas, que é o Imposto Sobre Serviços (ISS) e o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e fará uma distribuição de tributos no Brasil baseada no quantitativo populacional das cidades. “As cidades mineradoras, em sua maioria, não são populosas. O que elas têm de grande é a sua contribuição para o PIB brasileiro, no qual 4%, advém da mineração e 10% da balança de exportação”, alerta.
Dados divulgados pelo Ministério da Fazendo, nesta terça-feira (04/06), apontam que a economia brasileira cresceu 2,5% no primeiro trimestre do ano, em comparação com o mesmo período do ano passado. O crescimento da indústria foi influenciado pelas indústrias extrativas (5,9%), que registraram o melhor resultado influenciadas pela alta tanto da extração de petróleo e gás, como de minério de ferro.
“Infelizmente, diante do que traz a reforma tributária, essas cidades terão que adotar outras medidas legais para que a parte privada da mineração tenha que contribuir financeiramente, para que a atividade mineral volte a ser compensadora para os municípios e suas populações, já que a parte pública está sendo atropelada e deixada de lado nos principais debates. Estamos perdendo em ISS, ICMS e ainda teremos queda no recolhimento da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), já que o Imposto Seletivo (IS), criado para desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, como é o caso da mineração, poderá ser deduzido das bases da CFEM. Vamos lutar para que isso não aconteça”, enfatiza José Fernando.
A entidade tem buscado sem sucesso, até o momento, uma agenda com o governo federal desde o início do mandato do atual presidente para apresentar os principais entraves vividos pelos territórios minerados. E continuará tentando uma agenda dada a importância da pauta, não somente para os municípios, mas também estados e para o país. A associação, fundada em 20 de abril de 1989, conta hoje com 56 cidades filiadas de 8 estados da federação, representando 80% da produção mineral do país.
“A AMIG tem realizado uma série de estudos para comprovar os prejuízos que a reforma trará para as cidades mineradoras. No evento em Brasília vamos apresentar uma análise feita pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional – Cedeplar e pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas e Administrativas - IPEAD, ambos ligados à Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, que detalha em números o caos que temos tentado evitar”, conta Waldir Salvador, consultor de Relações Institucionais e Econômica da AMIG.
Entenda o contexto - Waldir Salvador ressalta que para que a população, o Congresso Nacional e os governos Estadual e Federal entendam o impacto da PEC 45/2019 nos territórios minerados é preciso contextualizar a história mais recente da mineração no país. “Na Constituição de 1988, os municípios mineradores foram beneficiados com a criação da CFEM, que demorou para sair do papel, mas foi o início de uma prosperidade maior e mais significativa para os municípios mineradores”, detalha. Ele explica que o Imposto Único Mineral (IUM), que existia na época, “não trazia praticamente nenhuma vantagem para os cofres das cidades mineradoras.” Em 1989, a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro, fixou em 2% a CFEM, incidindo sobre o valor do faturamento líquido resultante da venda da principal comodity do Brasil, o minério de ferro.
Outra conquista que mostrava um novo rumo para o lado público da mineração foi quando a AMIG entrou com uma ação pelo fim da dedução dos custos dos transportes na arrecadação da CFEM. “Isso gerou um aumento de receita significativo para os municípios, o que tornou uma um grande indício de que valeria a pena ser uma cidade mineradora”, relata.
Porém, a derrocada do lado público da mineração veio com a Lei Kandir (1996), que isentou o minério de ferro exportado e acentuou prejuízos bilionários aos municípios mineradores. “Deveríamos ter aproveitado a nossa riqueza para criar e incentivar a industrialização, assim como Getúlio Vargas fez, em 1946, com a criação da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional). Ao adotar a isenção, o Brasil opta pelo subdesenvolvimento, enquanto as mineradoras continuam se tornando potências mundiais”, observa.
Ao passar dos anos, para driblar o rombo trazido pela Lei Kandir e diante do descaso do governo federal em relação ao marco regulatório da mineração, antiga, e desatualizada com as regras internacionais, a AMIG juntou forças com demais entidades do setor para lançar, em março de 2014, o movimento “Minério Justo. “Graças à mobilização e trabalho hercúleo das associações, no dia 18 de dezembro de 2017, foi publicada a Lei 13.540 que altera as Leis n º 7.990, de 28 de dezembro de 1989, e 8.001, de 13 de março de 1990, que dispunha sobre a CFEM. Outra alteração fundamental, foi a inclusão dos municípios afetados pela atividade de mineração no rol de beneficiados pelo royalty.
Outra conquista relevante foi a partir da Lei 14.514/2022, na qual os municípios produtores também passaram a ter a possibilidade de receber a CFEM como afetados pela atividade mineral, desde que o valor devido na condição de afetado seja superior à parcela devida na condição de produtor. “E agora, novamente nos unimos, para mais uma vez tentar fazer uma mineração mais justa para o setor público, diminuindo o desequilíbrio de ganho que há com o setor privado. Vamos lutar para que a Lei Kandir seja extinta da reforma tributária ou que encontremos uma forma de minimizar os seus danos, seja, por exemplo, aumentando a alíquota da CFEM”, sugere Waldir Salvador.
O consultor da AMIG reforça que se o Imposto Seletivo tiver regras claras e justas de distribuição, além de deixar de ser abatido na CFEM, pode ser uma das alternativas para minimizar o impacto negativo da reforma para os municípios. “Porém, até o momento, não se tem uma previsão de distribuição do IS onde esse impacto é causado, como é o caso das cidades mineradoras. Vai se cobrar de quem explora em nosso território e distribuir pelo território nacional? Assim não é justo!”, alerta.
Waldir Salvador enfatiza que os municípios mineradores não têm autonomia sobre a atividade mineral no país, pois são leis federais que regem a mineração. “E o governo faz isso com um imenso descaso. Há três décadas o órgão que deveria nos proteger da cultura que sonega e desonera, que é a Agência Nacional de Mineração, está completamente falida. E o que vemos crescer são os desastres como Mariana e Brumadinho, o fortalecimento da mineração clandestina e seus impactos sociais, ambientais e econômicos, como ocorreu com o rompimento da barragem da Braskem, em Maceió. Além de acentuar o prejuízo dos municípios mineradores, causado pela permanente e crescente sonegação que há na atividade mineral”, pontua.